Amal Nasrallah
Os pagamentos realizados por sociedades brasileiras para residentes no exterior, decorrentes de contratos de repartição de custos podem, ou não, se sujeitar ao imposto de renda retido na Fonte – IRRF. A incidência do imposto passa pela análise das diversas espécies de contratos.
Existem vários tipos de contratos de repartição de custos que apresentam características diferentes entre si. As espécies de contratos mais comuns são as seguintes: (i) contrato de contribuição para custos (“cost contribution agreements” – CCA); (ii) contrato de prestação de serviços intragrupo e (iii) contrato de compartilhamento de custo.
O contrato de contribuição de custos é realizado entre sociedades com a finalidade de repartir riscos e custos despendidos no desenvolvimento ou produção de um determinado empreendimento (ligado à obtenção de ativos, tecnologia, serviços ou direitos). Geralmente é utilizado para o desenvolvimento de pesquisas que beneficiará as sociedades contratantes, pois cada uma delas será titular de parcela dos direitos relativos ao intangível que será produzido.
Em outras palavras, um grupo de empresas se associa (pool) para desempenhar uma determinada atividade (pesquisa, estudos) cujo resultado beneficiará todas. Nesse contrato as sociedades não objetivam apenas dividir gastos, mas também repartir os riscos e obter frutos decorrentes do empreendimento em comum. A expectativa de auferir benefícios mútuos é primordial para caracterização do contrato.
Pois bem, nesta hipótese, as contribuições das sociedades têm característica de investimentos. Não se trata de mero ressarcimento de custos incorridos. Cada pagamento ao exterior está relacionado ao cumprimento de uma obrigação própria decorrente do ônus de um negócio. É uma contribuição de capital, pois a sociedade no exterior não está recebendo qualquer rendimento ou pagamento pela prestação de um serviço. Por esta razão, a operação é intributável pelo IRRF.
Por outro lado, o contrato de prestação de serviços intragrupo ocorre quando uma sociedade que integra um grupo disponibiliza para as outras sociedades um conjunto de atividades de natureza administrativa, técnica, financeira ou comercial. Neste caso, o “centro de serviços” presta serviços numa base profissional, como se tratasse de uma empresa independente, relacionada com as demais sociedades do grupo por relações contratuais. Atividades administrativas como contabilidade, contas a receber e pagar, marketing, controle financeiro, informática, são atividades fim da sociedade prestadora destes serviços (centro de serviços), que terá como objeto no seu contrato social a realização destes. Além disso, a sociedade prestadora de serviços objetivará auferir lucro com estas atividades.
As demais sociedades passam a ser seus clientes e não há no caso qualquer relação de subordinação funcional ou técnica com as demais sociedades. Neste caso, os pagamentos efetuados à sociedade (centro de serviços) não têm natureza de rateio de custos, mas de verdadeira contraprestação, ou seja, de pagamento de preço pela prestação de serviços.
Neste caso a denominação de “cost sharing” é imprópria, pois não se está tratando apenas de repartição de custos, mas de divisão de despesas de interesse comum que tem natureza de preço. De se salientar que a característica se mantém mesmo na hipótese do preço ser estipulado com margem de lucro muito pequena, ou mesmo, de modo a cobrir apenas os custos. Por esta razão, o IRRF incide nas remessas ao exterior.
Finalmente, o contrato de compartilhamento de custo é firmado entre duas ou mais sociedades (que geralmente pertencem ao mesmo grupo) e tem por objeto o rateio de custos e/ou despesas com atividades meio, vale dizer, atividades não constitutivas do objeto social, tais como: contabilidade, contas a receber e pagar, marketing, controle financeiro, informática, que podem ser concentrados em apenas uma sociedade do grupo. Pode se referir, por exemplo, a fruição, por diversas empresas, de um único imóvel.
Nesta hipótese, os custos são incorridos por apenas uma sociedade do grupo (centro de custos). À sociedade centralizadora é atribuído o dever do pagamento perante terceiros, que deve ser realizado em nome próprio. Contudo, devido ao contrato celebrado entre as sociedades, cada uma delas fica responsável pelo reembolso do custo de manutenção por meio de parcela dos gastos relativos às atividades de interesse comum.
Assim, o pagamento tem caráter de ressarcimento e por esta razão, é possível entender que não incide o IRRF, contudo, será muito difícil a fiscalização adotar este entendimento.
A Receita Federal na Solução de Consulta nº 462 de 29 de Novembro de 2006 decidiu que, mesmo nesta hipótese incide o IRRF. Eis o teor da decisão:
“EMENTA: REMESSAS AO EXTERIOR – Contrato de Compartilhamento de Custo de Serviços Globais. A fim de cumprir as obrigações assumidas em contratos de custos/despesas compartilhados, pode a empresa líder do grupo utilizar-se de prepostos ou terceiros contratados para realizar as referidas atividades, recebendo de cada empresa beneficiada, mediante rateio das despesas, o valor por elas devido, na proporção do benefício recebido. Mesmo nas hipóteses em que os recursos são remetidos pela empresa beneficiária a título de reembolso, existem beneficiários finais, residentes ou domiciliados no exterior, dos recursos remetidos, a exemplo das pessoas (físicas ou jurídicas) que prestarão os serviços assumidos pela empresa líder. Por essa razão, as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas por fonte situada no País à empresa líder (pessoa jurídica domiciliada no exterior), a título de remuneração pela prestação contínua de serviços nas áreas: financeira e organizacional, de recursos humanos, de gerenciamento de risco, de padrões e política, e de estratégia e desenvolvimento, na proporção utilizada, a partir de 1º de janeiro de 2002, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de 15% (quinze por cento), por configurarem “assistência administrativa e semelhante” prestada por residente ou domiciliado no exterior”.
Finalmente é interessante destacar, que no âmbito internacional também não há uma diferenciação clara entre os serviços intragrupo e os contratos de compartilhamento de custos. A OCDE, apesar de fazer distinção entre os serviços intragrupo e os contratos de contribuição para custos, para fins de preço de transferência não diferencia o contrato intragrupo e o contrato de compartilhamento de custo, enquadrando toda execução de serviços no conceito de serviços intragrupo sujeito às regras de preço de transferência (cf. Transfer Princing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax Administrations).
Fonte: Migalhas