Por Adriana Aguiar
15/06/2015 05:00
A Fazenda Estadual de São Paulo foi condenada a pagar indenização por danos morais para uma companhia varejista que foi alvo da Operação Cartão Vermelho, deflagrada em 2007. Na época, a fiscalização cruzou informações dos contribuintes com dados fornecidos pelas operadoras de cartão de crédito e notificou vários deles por suposta sonegação de ICMS.
No caso julgado, a empresa foi inscrita indevidamente no cadastro de inadimplentes estadual o Cadin e executada por falta de pagamento de ICMS. A decisão, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), foi publicada na quinta-feira. Apesar de o valor da indenização ser de apenas R$ 10 mil, o entendimento pode ter um efeito cascata.
Na época, mais de 93,6 mil empresas, que em 2006 declararam operações de aproximadamente R$ 11,2 bilhões, foram notificadas devido a divergências com as informações repassadas pelas administradoras de cartão. No mesmo período, de acordo com as administradoras, foram transferidos R$ 24,2 bilhões aos estabelecimentos.
A operação, contudo, foi considerada ilegal em julgamentos no Superior Tribunal de Justiça (STJ). No TJSP, os contribuintes também têm vencido a maioria das ações para deixar de pagar multas e cobranças indevidas. No Tribunal de Impostos e Taxas (TIT), contudo, há autos de infração ainda mantidos.
Segundo o processo, a Fazenda teria inscrito a empresa no cadastro de inadimplentes do Estado de São Paulo (Cadin) em dezembro de 2012 e depois teria ajuizado uma execução fiscal por suposta falta de pagamento de ICMS no valor de R$ 648,1 mil, cujo auto de infração foi anulado pelo mesmo tribunal. Segundo a companhia, o fato causou “intensa dor moral”.
Em primeira instância, o juiz não aceitou a argumentação da empresa e extinguiu o processo. Contudo, a empresa recorreu.
Para o relator no tribunal paulista, desembargador Magalhães Coelho, o recurso deveria ser aceito porque o que ensejou a inscrição no Cadin foram informações bancárias protegidas por sigilo. “Portanto, a negativação do nome do autor não decorreu de ato ilícito praticado pela ré, como constou na sentença; pelo contrário, decorreu de violação de direito fundamental previsto constitucionalmente”, diz na decisão. Esse fato, segundo o desembargador, já tinha sido reconhecido pela primeira e segunda instância ao anular o auto de infração sofrido em outro processo.
Ainda, segundo a decisão, “a inclusão em cadastro de inadimplentes, o Cadin, e o ajuizamento de execução fiscal ao macularem a honra e a imagem do autor são dotados de inquestionável potencialidade lesiva, no caso concreto, com repercussões negativas, efetivamente perante credores, fornecedores e clientes em geral”. A decisão foi seguida pelos demais desembargadores da 7ª Câmara de Direito Público do TJSP.
O advogado que assessorou a empresa, Périsson Andrade, sócio do Périsson Andrade Advogados, afirma que essa é a primeira decisão que condena a Fazenda por danos morais decorrentes da Operação Cartão Vermelho. “Foi um absurdo. O governo do Estado já tinha sido notificado da decisão do tribunal que anulava o auto de infração e, a despeito disso, inscreveu a empresa no cadastro de inadimplentes e manteve a execução”, diz. Como o valor da indenização foi pequeno, o advogado afirma que vai recorrer.
A empresa teria comprovado, para anular o auto de infração, que a operadora de cartão de crédito teria atribuído a operação de três lojas da empresa em um único CNPJ. “Esses erros têm sido recorrentes”, diz Andrade.
A decisão, na opinião do advogado, pode servir de precedente para todas as empresas que foram alvo da Operação Cartão Vermelho e de outras semelhantes que ocorreram em outros Estados. Até porque o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou, em 2010, inconstitucional o artigo 5º da Lei Complementar nº 105, de 2001, que deu origem a essas operações estaduais. No julgamento, os ministros decidiram pela impossibilidade de o Fisco quebrar sigilo fiscal sem autorização judicial.
“Apesar disso, a maioria dos comerciantes prefere não entrar com o pedido de danos morais porque não querem problemas com o Fisco”, diz Andrade. O advogado afirma que tem cerca de 150 ações contra a Operação Cartão Vermelho em São Paulo, que tentam anular os autos de infração sofridos. “Temos êxito em 70% delas, nas demais ainda estamos recorrendo para os tribunais superiores.”
Para o advogado Horacio Villen Neto, do Magalhães, Villen & Ferreira Santos Sociedade de Advogados, a decisão vai na mesma linha do que tem decidido o STJ em outros casos que não envolvem especificamente a Operação Cartão Vermelho, mas que os ministros entenderam caber indenização por danos morais por ajuizamento indevido de execução fiscal e inscrição indevida no Cadin. “Não existem muitos precedentes porque o contribuinte não costuma ajuizar essas ações. Mas acredito que essa nova decisão poderá dar mais força à tese. Até porque essa indenização tem efeito educativo para o Fisco”, afirma.
Por nota, a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) de São Paulo informou que “analisará os termos da decisão e, se for o caso, interporá os devidos recursos aos tribunais superiores, no prazo legal”.
Fonte: Valor Econômico
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