O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJ-ES) permitiu que uma empresa mineira do setor de transportes use o crédito presumido do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), no percentual de 20%, nas operações interestaduais de transporte de carga e, ao mesmo tempo, utilize o crédito proporcional (80%) do tributo no recolhimento sobre operações futuras. Crédito presumido é uma espécie de desconto do imposto a ser pago na compra de insumos, independentemente da venda da mercadoria fabricada com eles. Da decisão cabe recurso.
Em 1996, o Convênio do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) ICMS nº 106 autorizou a concessão de crédito presumido do imposto em 20% na prestação de serviços de transporte de carga ou passageiro para as empresas dos Estados signatários. A mesma norma, porém, veda o aproveitamento de quaisquer outros créditos, como de custos com pneus, combustíveis e mecânica, entre outros.
Para algumas empresas, porém, a opção pelo crédito presumido seria pior do que o aproveitamento de créditos de ICMS obtidos do custo com determinadas mercadorias. Assim, elas resolveram ir à Justiça. “A ideia seria conjugar os dois regimes de créditos”, afirma o advogado Eduardo Arrieiro Elias, do Andrade Silva Advogados, que representa a empresa no processo.
O Supremo Tribunal Federal (STF) já julgou a questão em um recurso extraordinário e foi favorável à empresa. A Corte decidiu que o Fisco não poderia pedir a devolução (estorno) de 100% do crédito obtido pela empresa com seus custos, mas considerar o percentual relativo ao crédito presumido do ICMS. Porém, o STF não definiu o assunto com efeitos de repercussão geral.
Segundo Elias, as empresas continuaram a questionar o estorno na primeira e segunda instâncias da Justiça. A decisão do TJ-ES considerou o entendimento do STF e liberou o crédito limitado a 80%, com estorno de apenas 20%.
O advogado que representa a empresa mineira no processo afirma que a decisão pode ser usada em outros processos semelhantes. De acordo com Elias, até agora, no TJ de Minas Gerais, a decisão tende a ser desfavorável às empresas. No TJ de São Paulo, a jurisprudência ainda está indefinida.
Na prática, a empresa terá um ganho de milhões de reais, deixando inclusive de recolher ICMS em vários períodos, segundo o advogado. “Em relação à tributação que incide de agora em diante, a empresa já vai economizar. Quanto ao que teria sido indevidamente devolvido ao Fisco nos últimos cinco anos, a companhia conseguirá de volta só após o trânsito em julgado da decisão. O principal argumento foi o respeito ao princípio constitucional da não cumulatividade”, diz Elias.
Para o procurador Leonardo Gustavo Pastore Dyna, da Procuradoria-Geral do Estado do Espírito Santo (PGE), a lei é clara no sentido de que, se a empresa faz a opção pelo crédito presumido, não pode usar outra formas de creditamento. “A decisão do TJ-ES contraria a lei estadual e avaliamos qual seria o melhor recurso a apresentar. Estamos no prazo”, afirma.
A vedação não fere o princípio da não cumulatividade, segundo a PGE, porque o Estado confere o crédito presumido em troca. “Esse princípio existe para desonerar a cadeia produtiva do Brasil e o Estado desonera as empresas com o crédito presumido. Assim, a empresa nem tem que fazer contas para saber o quanto economizará”, afirma o procurador. “Se a empresa quer continuar no sistema de crédito e débito, basta não optar pelo crédito presumido.”
Apesar de a decisão do TJ ir no mesmo sentido do entendimento do Supremo, o advogado Júlio de Oliveira, do Machado Associados, defende que o crédito teria que ser mantido na integralidade. “Não deveria haver o estorno porque a Constituição só veda crédito se há isenção ou não incidência de imposto na saída, o que não é o caso”, afirma o advogado. Para o tributarista, do ponto de vista econômico, o estorno anula os efeitos do crédito presumido. Seria um toma lá da cá.
Fonte: Valor Econômico