Por Joice Bacelo
03/06/2015 05:00
Uma norma editada pela Receita Federal gerou insegurança entre as cooperativas de trabalho. O Ato Declaratório Interpretativo (ADI) nº 5, de 25 de maio, poderia levar ao entendimento, segundo advogados, que o recolhimento do tributo pela alíquota de 20% deve ser feito pelo cooperado, o que contraria a Lei nº 10.666, de 2003. A norma estabelece que as cooperativas são responsáveis pelo pagamento.
“Os 20% existem e são devidos, mas há um erro técnico no ato declaratório”, diz Fábio Medeiros, do escritório Machado Associados. “Só estaria correto se o contribuinte prestasse serviços como pessoa física, sem a intermediação da cooperativa”, completa o advogado, que chama a atenção para o risco de cooperativas serem autuadas por não recolhimento do tributo.
Medeiros explica que os cooperados prestam serviços para o contratante da cooperativa. E quem recebe o pagamento pelo trabalho é a cooperativa, que depois repassa os valores aos cooperados. É nesse repasse que a dedução dos 20% para a Previdência Social deve ser feita.
O advogado Rodrigo Alcade, sócio do Chediak Advogados, também critica o texto da norma. Segundo ele, não é possível saber se a retenção deve continuar a ser feita pela cooperativa ou se, a partir de agora, passará a ser de competência dos cooperados.
De acordo com o advogado, o ato dá a entender ainda que a Receita Federal estaria trocando a cobrança da contribuição previdenciária sobre o valor de nota fiscal ou fatura emitida por cooperativa, que era pago pelas empresas e foi considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por uma nova, a dos cooperados. “Antes, era a empresa contratante quem pagava e agora seria o cooperado [além da cooperativa], o que geraria duplicidade de contribuição”, afirma Alcade.
A decisão do STF seria o motivo para a edição do ato declaratório. No julgamento, os ministros entenderam que a Constituição estabelece o pagamento da contribuição previdenciária por pessoas físicas, e não pessoas jurídicas, como as cooperativas. Eles levaram em consideração o artigo 195. O dispositivo estabelece que as contribuições sociais do empregador incidem sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício.
Para o advogado Daniel Clarke, do Siqueira Castro, com a edição do ato declaratório, parece que a Receita estaria adaptandose à decisão do STF. Primeiro, para esclarecer que, independentemente do fato de a empresa não ter que pagar aqueles 15%, o cooperado continua tendo que pagar os 20%. Além disso, o artigo 2º do texto livra as empresas de pagar a porcentagem relativa à aposentadoria especial do cooperado.
Antes, além dos 15% sobre o valor da nota, as empresas pagavam 9%, 7% ou 5% para a aposentadoria especial quando o trabalho prestado pelo cooperado oferecia riscos à saúde ou sua integridade física. A porcentagem variava conforme o tempo de aposentadoria, de 15, 20 ou 25 anos.
“É uma medida que corrobora com a decisão do STF”, diz o advogado do Siqueira Castro. Na prática, as empresas contratantes das cooperativas não têm mais a obrigação de recolher nenhuma porcentagem referente à contribuição previdenciária.
Procurada pelo Valor, a Receita Federal informou que “a intenção do ADI foi a de esclarecer o percentual da contribuição devida” e que “a cooperativa de trabalho continuará retendo e recolhendo” os valores. Afirmou ainda, via assessoria de imprensa, que está providenciando um Ato Declaratório Executivo (ADE), onde constarão informações sobre todos os procedimentos de recolhimento da contribuição.
Fonte: Valor Econômico