Por Edna Simão, Eduardo Campos e Thiago Resende | De Brasília
Novos 25 setores da indústria, transportes e serviços foram desonerados da tributação sobre a folha de salários a partir do ano que vem, anunciou ontem o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Com essa ampliação, passam para 40 os setores que passarão a pagar a contribuição previdenciária sobre o faturamento.
“Elas pagariam R$ 21,570 bilhões de contribuição para o INSS em 2013 e pagarão a título de imposto sobre o faturamento R$ 8,740 bilhões. Uma redução grande, resultando em R$ 12,830 bilhões em desoneração. É uma boa desoneração, reduz custo da mão de obra para esse conjunto de empresas e as torna mais competitivas em um momento de crise”, disse o ministro.
Ele informou, também, que foi reduzido de dez para cinco anos o prazo de depreciação de despesas com aquisição de bens de capital para estimular investimentos. Esse benefício vigorará até o fim do ano. “Essas medidas contribuem para uma inflação menor. Os setores envolvidos se comprometeram a repassar para os preços essas reduções de custo”, disse Mantega. “Eles são, de certa forma, obrigados a repassar, pois sofrem concorrência do produto importado.”
A ampliação do benefício para 25 setores, contempla 20 segmentos da indústria, dois de serviços e três de transportes. Na indústria foram contemplados segmentos como aves, suínos e derivados; pescado; pães e massas; fármacos e medicamentos; equipamentos médicos e odontológicos; bicicletas; pneus e câmaras de ar; papel e celulose.
No ramo de serviços, as atividades de suporte técnico informática e manutenção e reparação de aviões. Os três segmentos de transporte beneficiados foram: aéreo; marítimo, fluvial e navegação; além de rodoviário coletivo.
Dos novos setores desonerados, dez atendem aos pleitos dos parlamentares inseridos na MP 563, que terá que ser sancionada pela presidente Dilma Rousseff até segunda-feira. Outros 15 são reivindicações que o Ministério da Fazenda resolveu incluir. Para isso terá que editar nova medida provisória nos próximos dias.
Segundo uma fonte da área econômica, praticamente todas as emendas parlamentares de inclusões de segmentos foram beneficiadas. Mas há alguns subsetores que solicitaram para ficar de fora e, portanto, serão vetados no projeto de conversão da MP.
Com essas medidas e a redução das tarifas de energia elétrica, conforme decisão também divulgada esta semana, o governo pretende incentivar a retomada dos investimentos pelo setor privado, mediante redução dos custos de produção e maior competitividade.
São, também, iniciativas que podem ajudar na política de controle da inflação. Na visão de agentes do mercado, com elas o governo estaria deixando em segundo plano o uso da taxa básica de juros como principal ferramenta para o controle de preços.
A queda da conta de energia elétrica, sozinha, pode resultar, segundo Mantega, em uma queda de meio ponto a um ponto percentual no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 2013. É inegável que todas essas medidas vão bater positivamente na inflação, mas a questão é se esse modelo de controle de preços se sustenta.
O ponto levantado por alguns economistas e tesoureiros é que o uso de ferramentas microeconômicas (corte de impostos e desonerações) para controlar uma variável macroeconômica (no caso a inflação) tem vida curta. “O governo vai ganhar tempo, não vai precisar subir juro em 2013. Mas quando passar esses choques que o governo está dando, a inflação pode sair do controle”, disse um tesoureiro.
Para o ministro da Fazenda, a inflação está sob controle no Brasil. O que acontece agora é um choque de oferta em função da seca no mercado externo, que afeta o preço dos alimentos. Mantega ressaltou que estão sendo tomadas varias medidas que contribuem para a queda dos preços. “Os preços que dependem de nós estão sob controle. Não há pressão inflacionária no país, fora esse choque de oferta. Teremos uma inflação bem comportada em 2013”, explicou.
A renuncia de receitas com as desonerações da folha de salário das empresas chegará, em 2013, a R$ 12,83 bilhões. Desse total, R$ 6,1 bilhões se referem aos novos setores beneficiados pelo governo. Já a depreciação acelerada, que diminui o pagamento de Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), custará R$ 1,374 bilhão.
No fim de agosto, Mantega informou que haveria uma reserva de R$ 15,2 bilhões no Orçamento de 2013 para novas desonerações. Ontem, ele explicou que as desonerações antigas também estão incluídas nesta margem. Ou seja, o valor reservado no Orçamento é apenas uma referência. “Posso garantir que vamos seguir fazendo desonerações”, destacou o ministro. Ele salientou, ainda, que que continuará com a política de corte de gastos de custeio.
As empresas atendidas com a desoneração deixam de pagar 20% sobre a folha de pagamento dos funcionários para desembolsar entre 1% e 2% do faturamento bruto. Uma parte dessa perda de receita será compensada pela cobrança adicional de um ponto percentual de Cofins sobre produtos importados, referentes aos setores desonerados. Não houve alteração em relação ao que foi anunciado, em abril, na ampliação do Plano Brasil Maior.
Desoneração já atinge 25% da indústria
Com a ampliação anunciada ontem, a desoneração sobre a folha de pagamentos passará a beneficiar segmentos que representam pelo menos 25,4% do valor bruto da produção industrial. O impacto, na verdade, deve ser maior porque o cálculo, feito com base na pesquisa industrial do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), deixou de fora da conta segmentos que não aparecem de forma separada nos dados.
Muitas das indústrias representativas na produção já estavam na lista inicial de 15 setores alcançados pelo incentivo, mas entre os 25 novos há segmentos de peso, como papel e celulose, medicamentos e fabricação de ferramentas.
“Existe uma mudança relevante na política econômica. As medidas de estímulo mais recentes buscam reduzir o custo da produção e destravar gargalos. Isso torna a indústria de transformação mais competitiva”, diz o gerente-executivo de política econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco. Para o economista, a redução no custo de energia, a preocupação com logística e infraestrutura e as desonerações mostram que a preocupação do governo está em “atacar questões estruturais pela oferta, e não simplesmente enfrentar as dificuldades apenas com medidas de estímulo à demanda”.
“A vigência das medidas ainda é pequena, mas os primeiros sinais mostram que o benefício melhora as condições de concorrência, desonera as exportações e onera as importações. Isso dá igualdade de condições para o produto nacional”, avalia o gerente da CNI. Ele acrescenta que essa mudança na política deve aumentar a confiança da indústria.
Julio Gomes de Almeida, consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), ressalta que a desoneração faz parte de um grupo maior de medidas. Ele destaca a redução de custos de infraestrutura com programas de concessão e a redução da taxa de juros. “A medida me parece importante ao lado de outras, mas leva tempo até surtir efeito e, sozinha, seu efeito é limitado.”
Além de segmentos da indústria de transformação, o incentivo anunciado ontem alcançou também alguns setores de serviço, como o de transporte aéreo. As cinco maiores companhias aéreas brasileiras, TAM, Gol, Azul, Trip e Avianca terão economia anual de R$ 300 milhões com a desoneração.
O cálculo é da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear). O presidente da entidade, Eduardo Sanovicz, diz que a medida abriu nova perspectiva. Para ele, a desoneração melhora a capacidade competitiva e abre uma agenda de diálogo. Na pauta de pedidos está a mudança no cálculo do preço do combustível e a unificação do ICMS sobre querosene de aviação.
Para Lourival Kiçula, presidente da Eletros, que representa os fabricantes de linha branca, a desoneração vai beneficiar o caixa das indústrias do setor que, juntas, empregam 35 mil trabalhadores no país. “Teremos grande vantagem competitiva”, diz. “É um alívio para quem produz.” Para a Eletros, a desoneração não compensará o fim do benefício do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI), que vale até o fim do ano.
O setor de medicamentos também recebeu bem a desoneração. “A medida vai ajudar a reduzir a pressão sobre custos do setor”, afirmou o porta-voz Nelson Mussolini, vice-presidente do Sindusfarma, que reúne as indústrias farmacêuticas. Segundo Mussolini, os custos do setor, que é altamente dependente das importações, cresceram 30% em dólar neste ano. A medida anunciada prevê também depreciação acelerada de máquinas e equipamentos, o que abre possibilidade de investimentos na capacidade dos laboratórios.
A indústria de celulose e papel também comemorou sua entrada na lista dos setores desonerados. A presidente da Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa), Elizabeth de Carvalhaes, diz que a medida é importante. “Mas há necessidade de olhar, urgentemente, para os exportadores.” Um dos pleitos da indústria é a prorrogação do Reintegra, que prevê a devolução de 3% da receita de exportação na forma de créditos tributários. Segundo Elizabeth, em agosto a receita com exportações de celulose e papel recuou 27% na comparação com mesmo mês de 2011.
A Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq) considerou “muito adequada” a desoneração, afirma o presidente da entidade, Synésio Batista. Para ele, o ponto mais importante é que a alíquota de 1% também será cobrada sobre importados. “É inteligente porque busca equiparação de preços.” A expectativa da Abrinq é que o setor de brinquedos cresça 7% em 2012, alcançando R$ 7 bilhões em preços ao consumidor. A associação se comprometeu em criar 1,8 mil empregos em 24 meses. Segundo Batista, a indústria vai repassar o benefício ao consumidor. (Carlos Giffoni, Alberto Komatsu, Mônica Scaramuzzo, Stella Fontes, Adriana Meyge, Leticia Casado e Marta Watanabe)
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