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Governo acha difícil listar impostos na nota fiscal

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MARIANA SCHREIBER e NATUZA NERY
DE BRASÍLIA

O ministro Guido Mantega (Fazenda) previu ontem dificuldades para implantar a lei que obriga notas fiscais a discriminar quanto foi cobrado de tributos. Aprovada anteontem pelo Congresso Nacional, ela precisa ser sancionada pela presidente Dilma Rousseff para passar a valer.

Em entrevista, o ministro disse que não será possível incluir tributos que são cobrados a posteriori, como, por exemplo, o Imposto de Renda. A Folha apurou que o governo considera impossível seguir o que determina a lei no caso do IR.

“Por exemplo, o Imposto de Renda, que é cobrado sobre o resultado das operações das empresas. Como é que uma empresa vai colocar na nota fiscal o Imposto de Renda se ela só sabe isso [depois]… Ela pode até nem pagar se não tiver lucro”, afirmou Mantega.

Para esse caso específico, o Executivo considera impossível incluir informações sobre o IR baseado no lucro presumido das empresas.

O ministro apontou, ainda, limitações técnicas à implementação da nova obrigação.

“Existe um problema operacional também, pois nós acabamos de implementar a nota fiscal eletrônica e nós teremos que modificar todo o programa de nota fiscal eletrônica para incluir um novo item. Isso parece fácil, mas é uma dor de cabeça operacional”, argumentou.

Há, portanto, chances de veto ao texto aprovado, mas técnicos da Fazenda ainda tentam formas de operacionalizar a medida.

Se entenderem por sua inviabilidade, formalizarão proposta de veto ao gabinete de Dilma Rousseff.

MAIS CRÍTICAS

Apesar de declarar apoio à transparência, alguns integrantes do governo reconhecem a inconveniência de ter o gasto com impostos descritos ao final de uma compra.

Em tese, apesar de as alíquotas serem públicas, o argumento é que a divulgação aumentaria muito o nível de críticas sobre a alta carga tributária paga pelo consumidor brasileiro.

Ao todo, deverão ser discriminados nas notas nove tributos: ICMS, ISS, IPI, IOF, IR, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), PIS/Pasep, Cofins e Cide.

O ministro disse que os tributos que são cobrados no ato da venda do produto, como ICMS, ISS e PIS-Cofins, podem ser facilmente incluídos na nota fiscal.

Mantega afirmou ser favorável à transparência determinada pela lei, mas não deu uma resposta definitiva sobre se o governo irá sancionar a norma ou se irá vetá-la.

“Em princípio, eu sou a favor de a gente divulgar os tributos, mas levando em consideração essas ressalvas”, acrescentou o ministro.

Segundo o texto que saiu do Congresso para a sanção presidencial, comerciantes serão obrigados a incluir nas notas fiscais o valor dos tributos federais, estaduais e municipais que incidem sobre o preço da mercadoria ou do serviço.

Na votação de anteontem, os líderes do governo na Câmara encaminharam voto contrário ao projeto, o que seria uma outra indicação de que a equipe da presidente Dilma se opõe às novas medidas. Apesar disso, a lei foi aprovada pelos deputados.

Nova nota fiscal pode ter custo para o consumidor
HELTON SIMÕES GOMES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A discriminação de impostos incidentes sobre serviços e produtos na nota fiscal poderá ter custos para ser implantada, que serão repassados ao consumidor, avaliam entidades da indústria e do comércio ouvidos pela Folha.

Anteontem a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei -que ainda precisa ser sancionado pela presidente para entrar em prática- que obriga a discriminação dos tributos pagos, seja nas notas, seja em cartazes nos pontos de venda.

Para informar o consumidor, as empresas terão que implantar sistemas que apurem a incidência de tributos sobre cada produto.

“A dificuldade vem desse pântano que é a rede complexa do sistema tributário brasileiro”, diz André Rebelo, assessor de assuntos estratégicos da Fiesp (Federação das Indústrias de São Paulo).

A opinião é compartilhada pela Fecomércio-SP. Segundo as entidades, essa será mais uma das chamadas obrigações acessórias, nome dado às comprovações prestadas por empresas da quitação de compromissos fiscais.

Estudos mostram que no Brasil são gastas 2.600 horas para se apurar impostos, quando a média de países em desenvolvimento é de 500.

SOFTWARE GRATUITO

Para a Afrac (Associação Brasileira Automação Comercial), será necessária a renovação do parque tecnológico, mas isso terá um custo trivial.

Impostos diretos como IPI e ICMS já são auferidos no momento da compra. Para outros como o IR, mensurado após a compra, terão que ser feitas adequações.

A ACSP (Associação Comercial de São Paulo) afirmou já ter desenvolvido um software que faz a apuração de todos os tributos, que será distribuído gratuitamente.

Para os advogados Walter Cardoso Henrique e Luis Antônio Caldeira Miretti, que integravam a comissão de assuntos tributários da OAB-SP e redigiram o corpo da lei, a discriminação dos tributos na nota podem ser uma ferramenta para o contribuinte pressionar o governo a fornecer melhores serviços.

A lei regula o artigo 5º da Constituição, que dá ao cidadão o direito de saber quanto é gasto com tributos -a carga tributária do Brasil hoje está em 35% do PIB.

“Saber quanto paga de imposto é tão importante quanto as leis da Ficha Limpa e de responsabilidade fiscal”, diz Henrique.

O projeto de lei foi originado de uma ação popular que recolheu 1,5 milhão de assinaturas.

Análise: Medida é inócua; o principal é simplificar o sistema tributário
ANTONIO CARLOS R. DO AMARAL
ESPECIAL PARA A FOLHA

O projeto de lei aprovado pela Câmara dos Deputados que determina que em milhões de mercadorias e serviços seja “aproximadamente” discriminado o valor da “totalidade dos tributos federais, estaduais e municipais”, cuja incidência “influi na formação dos respectivos preços”, impõe algo infactível.

Não há como sequer imaginar a viabilidade de se concretizar a “aproximação” da carga tributária real de tributos tão díspares quanto ICMS, ISS, IPI, IOF, IR, CSLL, PIS, Cofins, Cide, II, PIS e Cofins/Importação, cobrados sob os regimes tributários mais diversos (cumulativo, não cumulativo, presumido, real, simples, supersimples etc.).

Para não dizer a distorção causada pela exclusão dos tributos previdenciários sobre a folha de salários e também patrimoniais (IPTU, IPVA etc.), que oneram de formas distintas fornecedores e fabricantes de produtos e serviços diferentes.

Ademais, impõe penalidades atrozes. Quem não expuser o custo tributário nos bens e serviços sofrerá de multa a apreensão do produto, suspensão no fornecimento do serviço a interdição parcial ou total do estabelecimento ou da atividade empresarial.

O benefício pretendido, transparência na carga tributária para o cidadão, não se dá por propostas mirabolantes. Não consta na experiência mundial nada que se aproxime de uma fórmula tão retumbante mais para confundir do que elucidar.

No Canadá, na década de 90, foi feita uma campanha educativa de esclarecimento ao contribuinte sobre o funcionamento do sistema tributário e do imposto sobre o valor agregado. Algo didático e ilustrativo que poderia ser encampado no Brasil.

Importante é ensinar como se pode chegar a uma carga tributária de 60% em um automóvel, por exemplo, e porque isso não é fácil de ser calculado, pois os tributos incidem uns sobre os outros, de forma camuflada muitas vezes, com alíquotas que se sobrepõem etc.

O Congresso Nacional poderia, sim, simplificar o burocrático sistema tributário brasileiro.

Dar transparência não é impor mais encargos e obrigações às empresas, mas contribuir para um sistema mais simples e menos oneroso ao país.

ANTONIO CARLOS RODRIGUES DO AMARAL é presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB-SP, professor de direito na Universidade Mackenzie, master of Laws pela Harvard Law School e pós-graduado em tributação comparada e internacional pela Harvard University.

Fonte: Folha de São Paulo

Site: Contador São Paulo