Daniel Tanganelli Coelho*
O Governo Federal vem lançando, no decorrer do ano, diversos “planos” de desoneração fiscal para a economia nacional. Com a eloquência de costume, em abril ampliou a desoneração da folha de pagamento de indústrias e de prestadores de serviços – uma das medidas do chamado “Plano Brasil Maior”.
A folha de pagamento das empresas brasileiras há tempos sofre incidência do INSS patronal, contribuição previdenciária que incide à alíquota de 20% sobre valores pagos a empregados, avulsos e a contribuintes individuais. A mencionada desoneração tratou de trocar a incidência sobre a folha de pagamento que gera altos custos ao empresariado pela incidência sobre a receita bruta da empresa, em 1% para indústrias e 2% para prestadores de serviços. Essa medida geralmente (mas nem sempre) reduz tais custos.
O que incomoda é a maneira pela qual o Palácio do Planalto vem implementando diversos desses pacotes de desoneração fiscal. Aos trancos e barrancos, como se decidisse do dia para a noite qual o novo setor da economia a ser agraciado com novos incentivos, o Executivo Federal dispara alterações na legislação tributária e com isso dá indícios de inexistência de qualquer “plano” para aliviar os ônus da economia nacional.
Voltemos à desoneração da folha de salários das empresas. Ela fora introduzida inicialmente no ordenamento jurídico pela Medida Provisória 540/2011 e em grande escala pela Medida Provisória 563/2012, com vigência a partir de 1º de agosto. Assim, a partir dessa data, as empresas sujeitas à medida (têxtil, confecções, couro e calçados, móveis, plásticos, materiais elétricos, autopeças, ônibus, naval, bens de capital, mecânica, hotéis, tecnologia da informação e comunicação, call center e “design house” – chips para computadores) vêm recolhendo obrigatoriamente o INSS patronal sobre a receita bruta, nos termos da medida provisória. Na conversão da MP nº 563 em lei e também com a edição da recente Medida Provisória 582/2012, novos setores da economia foram incluídos.
Em resumo, as alterações legais determinam que o INSS patronal passe a ser calculado por meio da aplicação da alíquota de 1% ou 2% sobre as receitas oriundas das atividades incentivadas mencionadas acima.
Entretanto, a proporção de eventuais receitas diversas não incentivadas (aluguéis ou venda de mercadorias não abrangidas pelo incentivo, por exemplo) em relação à receita bruta total deverá ser multiplicada pelo valor que seria recolhido sobre a folha de pagamento se calculado pela maneira tradicional (20% sobre a folha).
A combinação dos resultados [(1% ou 2% sobre a receita incentivada) + (proporção das receitas diversas não incentivadas x 20% x folha)] é o valor a ser recolhido referente ao INSS patronal para aquele mês.
São permitidas algumas exclusões da receita bruta para fins de cálculo da contribuição (ICMS-ST, vendas canceladas, entre outras), porém ainda não é claro se a exclusão é feita em relação às receitas incentivadas ou à receita bruta como um todo. Um tanto confusa, a metodologia vem causando diversos questionamentos.
É possível tecer a interpretação mais segura do ponto de vista fiscal com base na legislação e em pronunciamentos da Receita Federal, porém o risco ainda se faz presente.
A MP 563/2012 foi convertida e deu origem à Lei 12.715/2012. Esse novo diploma trouxe alguns ajustes na metodologia de cálculo do INSS patronal e sujeitou novos setores da economia à medida, como já mencionado. Além disso, discretamente, sujeitou a eficácia da desoneração sobre a folha à futura regulamentação, exceto em relação a poucas mercadorias, sobre as quais terá vigência a partir de janeiro de 2013 (caso do setor de prestação de serviço de transportes, entre outros). Explica-se: a redação legal estabelece que os dispositivos que preveem a desoneração em comento terão vigência em 1º de agosto, mas condicionou a produção de seus efeitos à sua regulamentação. Apenas o chefe do executivo federal, ou o ministro da fazenda (por delegação), possuem competência para expedição desse ato regulatório.
Mas tal regulamentação ainda não existe!
Se não existe, a previsão de desoneração sobre a folha de pagamento das empresas contida na Lei 12.715/2012 não é apta a gera efeitos. Como consequência, as empresas devem voltar a recolher pela metodologia tradicional, ou seja, sobre a folha, considerando que a medida não possui fundamentação que permita a produção de efeitos jurídicos.
Breve existência para tão alardeado benefício fiscal, se é que pode ser chamado de benefício, visto que algumas empresas tiveram crescimento no valor de INSS patronal a recolher quando calculado pela nova sistemática.
E a previsão contida na MP nº 563? Não daria base para a continuidade da desoneração sobre a folha de salários? Uma vez que a MP é convertida em lei, seus efeitos cessam. Em outras palavras: a desoneração fiscal sobre a folha de pagamento das surtiu efeito de 1º de agosto a 17 de setembro de 2012. A partir do dia 18, a redação legal suspendeu seus efeitos, o que o governo parece ignorar.
A questão central é que o empresário, aquele que deveria ser beneficiado pela medida, não sabe ao certo o que fazer. Ou continua aplicando o INSS patronal sobre a receita e descumpre a redação legal – expondo-se a riscos fiscais em potencial, ou para de aplicar a medida devido à suspensão legal e deixa de aproveitar a desoneração que o próprio governo federal diz ter instituído. O mais prudente parece ser analisar os efeitos específicos da desoneração sobre o negócio, ponderando a vantagem econômica e os riscos fiscais envolvidos e decidir pela aplicação, ou não, da desoneração. Visto o peso político e econômico da desoneração sobre a folha, espera-se uma atitude positiva das autoridades em relação aos contribuintes que continuarem a aplicá-la..
Uma vez que a ideia é estimular a economia e trazer competitividade, pode-se dizer que esse foi um desencontro do Governo Federal. Mais uma vez o contribuinte é vítima do nada discreto “desregulamento tributário” que contamina a economia desse país.
Fonte: FISCOSoft
Site: Contabilidade SP