Por Roberto Goldstajn
O governo federal tem envidado esforços para tornar o Brasil mais competitivo por meio de renuncias fiscais para determinados setores, esquecendo-se de que muitas vezes as decisões refletem protecionismo e/ou barreiras à entrada de produtos estrangeiros no país.
No entanto, ditos pacotes fiscais sequer atacam um dos principais problemas da malfadada carga tributária brasileira, nesse caso, a complexidade de seu sistema tributário, o qual é regido por uma série de princípios constitucionais que disciplinam de forma rigorosa a possibilidade de criação de exigências fiscais e a excessiva carga que isto representa, e que se reflete na escrituração contábil.
Com efeito, a Constituição Federal outorgou competência, atribuiu finalidade e estabeleceu regras específicas para União, Estados/Distrito Federal e municípios legislarem acerca das exações fiscais que lhes dizem respeito.
Ainda se não bastassem os cuidados acima, o texto magno buscou trazer conceitos de direito privado como tentativa de evitar distorções e, com isso, supostamente, garantir a segurança necessária às partes envolvidas (Fisco e Contribuinte).
Adiciona-se a esses cuidados o disposto no artigo 110 do Código Tributário Nacional que estabelece que “a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.”
Dessa forma, o sistema tributário brasileiro quando da promulgação da Constituição Federal em 1988 gozava de um aparente equilíbrio de forças.
Contudo, em função de diversas divergências interpretativas relacionadas à ocorrência do fato gerador, à definição de base de cálculo, dentre outros, o Fisco e os contribuintes travaram inúmeras discussões e se socorreram do Poder Judiciário para deslinde dessas controvérsias.
Nem sempre o Poder Judiciário tem agido acertadamente como se depreende da discussão clássica acerca do conceito de faturamento onde o Fisco até hoje determina a inclusão do ICMS nas bases de cálculos da Cofins e do PIS, o que parece equivocado eis que não se trata de preço do produto mas de tributos incidentes sobre ele.
Ora, o faturamento está relacionado com o ato de faturar, emitir fatura de venda mercantil ou prestação de serviços e os tributos não estão inseridos dentro desse conceito, como de resto não poderiam estar.
Também podemos citar o litígio envolvendo lucros auferidos pelas empresas proveniente de operações de suas controladas ou coligadas no exterior, cuja discussão gira em torno da ocorrência do fato gerador. Nesse caso, os contribuintes defendem que ditas exigências somente podem valer a partir da disponibilidade econômica dos recursos a seus acionistas no Brasil de acordo com os princípios contábeis, ao contrário do que preconiza o artigo 74 da Medida Provisória nº 2.158-35 editada em 2001.
Em ambos casos, espera-se que o Supremo Tribunal Federal – guardião da Constituição Federal – dê a palavra final sem distorcer os conceitos definidos pelas normas contábeis.
Cumpre destacar que existem outras discussões, ainda em fase inicial, envolvendo a aplicação de conceitos contábeis, tais como, a constituição do ágio para efeito de dedução do Imposto de Renda sobre Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
No tocante à constituição do ágio, o ponto central desse confronto, desde que observadas as normas legais, gira em torno da identificação da substância econômica para validação da operação, e em que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) tem sido -por enquanto – o principal julgador.
Caso essa e outras discussões em andamento cheguem aos tribunais superiores, a expectativa é de que as normas contábeis sejam levadas em consideração, especialmente quando se caminha, rapidamente, para a adoção do IFRS.
Indiscutível a importância do delineamento do Sistema Tributário Nacional imposto pela Constituição Federal, porém, o excesso de regras constitucionais tem contribuído para o seu “engessamento”, o que inviabiliza a atração de novos investimentos nacionais e internacionais.
Diante desse cenário, propõe-se aqui uma ampla discussão para viabilizar um novo modelo constitucional tributário mais simples onde os princípios fundamentais e aqueles inseridos no artigo 5º da Constituição Federal acrescidos de regras básicas para outorga de competências tributárias sem se aprofundar em conceitos amplamente difundidos em normais contábeis seriam suficientes.
Dentro desse contexto, o Fipecafi e outros órgãos afins ganhariam um papel de suma importância para suportar o equilíbrio nas relações entre Fisco e contribuintes.
Com isso, resta evidente que a busca pela simplificação do sistema tributário nacional e a respectiva harmonização de suas regras com os padrões internacionais de contabilidade se trata de uma medida emergencial como forma de viabilizar novos investimentos indispensáveis ao progresso do Brasil.
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