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Carf, alienação ou resgate de quotas e outras questões tributárias

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Resgate de quotas

30 de abril de 2015, 8h00
Por Mary Elbe Queiroz e Antonio Elmo Queiroz
Em uma ação judicial de dissolução parcial de sociedade, houve a homologação de acordo fixando o valor das quotas, que seria recebido parceladamente pelo sócio retirante. Ainda para compor o quadro fático, deve-se registrar que a sociedade, para não ficar desfalcada daquelas quotas, realizou o ingresso de novos sócios.
Tendo em vista que o próprio sócio retirante tratou o ingresso do valor como sendo fruto de alienação de participação societária em sua Declaração de Ajuste Anual, o fisco federal tributou o acréscimo patrimonial da correção acordada para a devolução dos valores das quotas.
A autuação gerou uma execução fiscal, vindo por fim o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) julgar pela anulação do lançamento, pois, em que pese ter havido saída e ingresso de sócios ao mesmo tempo, não se tratou de uma cessão onerosa de quotas, já que existiram duas operações separadas; logo, sendo apenas devolução de participação em capital social, não há tributação por expressa previsão legal (parágrafo 4º do artigo 22 da Lei 9.249/95); assim ementado e fundamentado:
Apelação 5037329-61.2014.404.7100 (divulgado em 20.04.2015)
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. RETIRADA DA SOCIEDADE POR COTAS. INDENIZAÇÃO. DISSOLUÇÃO PARCIAL. FATO GERADOR. NÃO CARACTERIZADO. (…)
1. A cota social do sócio excluído ou que se retirar voluntariamente da sociedade por cotas deverá ser paga ao retirante mediante apuração do seu respectivo valor, sendo que para tal deverá ser levada em consideração a situação patrimonial da empresa, na época da referida dissolução parcial. O quinhão do patrimônio social correspondente às cotas do sócio retirante será a ele entregue, seja em espécie, seja em bens móveis ou imóveis, mediante apuração específica para esse fim, portanto, o pagamento será feito pela sociedade.
2. Hipótese que o pedido judicial e o acordo homologado determinaram a retirada do sócio com a indenização deste pelas suas cotas.
3. A legislação aplicável ao caso indica que a devolução de bens e direitos a título de devolução de participação em capital social não constitui fato gerador do tributo, pois extrapola o conceito de renda, proventos e acréscimo patrimonial. Para o sócio retirante não há fato gerador de imposto de renda, pois será a sociedade a devedora do imposto de renda nesse ganho de capital advindo da valorização dos bens e direitos entregues.
4. Portanto, a devolução de cotas de sociedade não implica incidência de imposto de renda, até porque não se trata de hipótese de distribuição disfarçada de lucros, o que visivelmente não ocorreu no caso.
VOTO (…)
Não se desconhece, contudo, que, calcada a sociedade na faculdade disposta na sentença homologatória, foi promovida a alteração do contrato com a consolidação da retirada do sócio e, ainda, com o ingresso de novos sócios em lugar do retirante, de tal modo que a sociedade continuasse a funcionar a mesma estrutura de cotas (…).
Nada obstante, já que o pedido judicial e o acordo homologado determinaram a retirada do sócio com a indenização deste pelas suas cotas, não se pode ver aí um negócio de cessão onerosa de cotas. O que houve não foi a cessão de cotas do sócio retirante, mas sim a indenização pela sua retirada (pagamento das cotas) e, simultaneamente, a sociedade admitiu novos sócios a fim de manter o seu capital social. Ou seja, houve duas operações: (1º) direito de retirada com indenização das cotas, e (2º) admissão de novos sócios com cotas proporcionais àquele quinhão do sócio retirante. Pouco importa que tais movimentos tenham sido instrumentalizados numa mesma alteração do contrato social, já que isso foi expressamente autorizado pela sentença. (…)
Pouco importa que o valor de mercado dos bens entregues pela pessoa jurídica em pagamento ao sócio retirante seja superior àquele registrado na contabilidade. Para o sócio retirante não há fato gerador de imposto de renda. Será a sociedade a devedora do imposto de renda nesse ganho de capital advindo da valorização dos bens e direitos entregues.
Demandas coletivas
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional elaborou um parecer tratando da tutela coletiva em causas tributárias. O exaustivo estudo centrou a atenção na legitimidade ativa para propor a demanda, bem como na eficácia da decisão; assim ementado e fundamentado:
Parecer PGFN/CRJ 269/2015 (publicado em 17.03.2015)
3. Apesar da controversa vedação ao manejo de ações coletivas em matéria tributária (parágrafo único do art. 1º da Lei nº 7.347/85, que, conforme orientação do Parecer PGFN/CRJ Nº 2527/09, seria aplicável não apenas à ação civil pública) temos enfrentado elevado número de demandas dessa natureza, de modo que a legitimação ativa ad causam e os limites da eficácia subjetiva da sentença coletiva (delimitação dos substituídos) — diante dos sérios riscos de grave lesão à ordem econômica, social e financeira provocados por essa espécie de tutela jurisdicional e da árdua tarefa de manter atualizados os sistemas da dívida ativa — são assuntos que merecem especial atenção em nossa atuação. (…)
Assim, as orientações deste parecer têm maior relevância na fase de conhecimento, já que, após o trânsito em julgado, eventual discussão quanto aos limites subjetivos em fase de liquidação/execução se dá a partir de análise casuística dos termos do título executivo, o qual, em tese (a menos que utilizados os meios cabíveis, a exemplo da ação rescisória), não pode ser contrariado, mas, muitas vezes, precisa ser interpretado, por apresentar deficiências e não ser suficientemente claro (o que deve ser combatido ainda na fase de conhecimento, evitando essa necessidade de discussão futura). (…)
199. Do exposto, extraem-se as seguintes conclusões, no essencial:
199.1. É na categoria dos direitos individuais homogêneos que se enquadram, em princípio, pretensões concernentes ao direito tributário veiculadas através de ações de natureza coletiva;
199.2. Inexiste vedação apriorística à tutela coletiva de pretensões de natureza tributária, mas estas, quando relacionadas a direitos individuais homogêneos, só podem ser veiculadas, a seara coletiva, através de mandado de segurança ou injunção coletivo e de “ação ordinária” coletiva, pelos respectivos legitimados e observados os pertinentes limites; (…)
199.6. Podem, em tese, observados os pertinentes requisitos, propor mandado de segurança coletivo: associações, sindicatos, entidades de classe, centrais/federações/confederações (vedada a substituição per saltum), determinados conselhos profissionais (Conselhos Federal e Seccionais da OAB, por exemplo) e partidos políticos com representação no Congresso Nacional (com esta permanecendo durante toda a tramitação da demanda);
199.7. Em matéria tributária, somente os sindicatos (denominação privativa das entidades sindicais de primeiro grau que ostentam registro sindical) podem, em tese, propor “ação ordinária” coletiva em substituição processual, limitada esta à respectiva categoria econômica/profissional e base territorial; (…)
199.10. Caso objetive ampla substituição processual, não se restringindo aos associados (entidades associativas) ou à categoria (sindicatos), a “ação ordinária” coletiva em matéria tributária (em se tratando de direitos individuais homogêneos) deve ser considerada ação civil pública e extinta com base no art. 1º, parágrafo único, da Lei nº 7.347/85;
199.11. Sentença proferida em ação de natureza coletiva não é norma jurídica geral e abstrata, devendo ser respeitados os limites subjetivos e objetivos do decidido, sem prejuízo da possibilidade de a Administração, discricionariamente e em nome de valores tais quais a isonomia e segurança jurídica, refletir acerca da sua posição ou mesmo avaliar a viabilidade de dispensa de contestação e/ou recursos; (…)
199.13. Em se tratando de ação de natureza coletiva ajuizada por entidade associativa em defesa de seus associados, só são processualmente substituídos/representados aqueles que, na data da propositura da ação, eram filiados e tinham domicílio no âmbito da competência territorial do juízo originariamente competente para apreciar a demanda, interpretados os limites daquela, em não se tratando de MSC, de acordo com as normas de organização judiciária, ainda que tal juízo integre a seção judiciária do Distrito Federal (irrelevância, no ponto, do art. 109, §2º, da CF); (…)
199.15. No mandado de segurança coletivo, a competência territorial do juízo, para fins de aplicação do critério territorial de limitação subjetiva, equivale à área de atuação da autoridade coatora;
Decisões variadas
a) No Acórdão 9202-003.483 (publicado em 25.02.2015), a CSRF do Carf, ante a firme jurisprudência de que rendimentos declarados devem ser abatidos no cálculo de uma omissão bancária, estabelece uma distinção para negar que esse entendimento se aplique quando a conta bancária esteja no exterior; assim ementado: “não se opera a presunção de que valores tributados na Declaração de Ajuste Anual, pagos por fontes situadas no País, integrariam depósitos bancários, quando se trata de conta mantida no exterior, à margem do sistema financeiro oficial”.
b) No Acórdão 9202-003.566 (publicado em 20.02.2015), a CSRF do Carf aplica o requisito do interesse processual para não conhecer Recurso Especial da Fazenda Nacional, pois, se modificado o Acórdão recorrido, o lapso decadencial poderia diminuir, o que iria de encontro ao interesse fazendário; assim ementado: “considerando-se que a parte do acórdão que reconheceu o vício formal do lançamento não foi objeto de recurso do contribuinte, torna-se definitiva administrativamente a questão, aplicando-se ao eventual lançamento substitutivo o prazo do art. 173, II do CTN. Entretanto, a aplicação do art. 18, § 3º do Decreto 70.235, de 1972, está sujeita aos prazos dos arts. 150, §4o., ou 173, I do CTN, conforme o caso. Isso traria situação pior da que foi decidida no acórdão recorrido, carecendo a Recorrente de interesse recursal”.
Mary Elbe Queiroz é advogada e professora, pós-doutora em Direito Tributário pela Universidade de Lisboa, e doutora pela PUC-SP; mestre em Direito Público pela UFPE; presidente do Centro de Estudos Avançados de Direito Tributário e Finanças Públicas do Brasil; presidente do Instituto Pernambucano de Estudos Tributários; membro imortal da Academia Brasileira de Ciências Econômicas, Políticas e Sociais; membro do Conselho Jurídico da Fiesp (Conjur); sócia do escritório Queiroz Advogados Associados e Palestrante da FocoFiscal.
Antonio Elmo Queiroz é advogado, sócio do escritório Queiroz Advogados Associados e diretor do Centro de Estudos Avançados de Direito Tributário e Finanças Públicas do Brasil.
Revista Consultor Jurídico, 30 de abril de 2015, 8h00